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sábado, 15 de fevereiro de 2020

𝑨𝒄𝒊𝒅𝒆𝒏𝒕𝒆 𝒏𝒂 𝒍𝒊𝒏𝒉𝒂 𝒅𝒐 𝑻𝒖𝒂 – “𝑴𝒊𝒔𝒔ã𝒐 𝒅𝒖𝒎𝒂 𝒗𝒊𝒅𝒂” … 𝒗𝒊𝒗𝒊𝒅𝒂 𝒏𝒂 𝒑𝒓𝒊𝒎𝒆𝒊𝒓𝒂 𝒑𝒆𝒔𝒔𝒐𝒂. Parte 1



Dos atos às palavras de alguém que viveu esses dias “por dentro”, o copiloto desse resgate, João Silva dos Santos, na primeira pessoa e, há um ano atrás fez esse relato, que agora transcrevo, em memória ao comandante/piloto, João Lima que perdeu a vida a 15 de dezembro de 2018, em Valongo, após o helicóptero se ter despenhado, tendo falecido também o copiloto, um médico e uma enfermeira.
Um depoimento emocionante com imagens desses dias, captado via redes sociais, que aqui será apresentado em duas partes devido à sua extensão.







“Faz hoje 12 anos (a fevereiro de 2019)  que se deu o acidente com o comboio do Tua. Costumo assinalar esta efeméride mas hoje é muito especial relembrá-la porque o grande herói desse dia infelizmente já não se encontra entre nós.
In memoriam João Lima
Dizem que as memórias devem ser eternas sejam boas ou más mas para que a memória não se apague devemos prestar homenagem relembrando aquilo que merece ser lembrado, relembrado e homenageado se for o caso.
Nem todos os heróis usam capa e espada, voam sobre arranha-céus e lutam contra o mal. Existe outro tipo de pessoas cujos actos e forma de vida se assemelha a heróis mas na realidade não passam de pessoas que riem sofrem e estão sempre dispostos a correr riscos para ajudar ou salvar pessoas anónimas. Eu os apelido de cidadãos patriotas atrás duma forma de vida e onde alguns já encontraram a morte.
A melhor maneira das pessoas saberem quem são e o que fazem vou relatar a seguir aquilo a que chamo a "Missão duma vida" que começou no dia 12 de Fevereiro e terminou no dia 19 Fevereiro de 2007.
Vou contar na primeira pessoa, porque eu fiz parte dessa missão, onde todo o mérito, audácia determinação e valor do comandante João Lima tornou possível salvar a vida a duas pessoas no dia do acidente, dois mergulhadores durante as buscas e recuperar dois corpos para serem restituídos às famílias para que os pudessem chorar, homenagear e fazer um funeral.

A missão duma vida - 1ª Parte
Tinha sido uma tarde muito feia de chuva e frio e a tripulação de serviço permanecia na sala de operações a ver um qualquer programa de televisão quando o telefone do operador de rádio que se encontrava na sala ao lado tocou. Como os toques são diferentes percebemos logo que era do exterior para possível missão mas quando o operador atendeu a dizer "Base permanente de Santa Comba boa noite" paramos todos para ouvir o que era. Ficamos todos suspensos até que o operador avisa "Vai haver missão. Caiu um comboio a um rio com multi vitimas e possivelmente algumas dentro de água".
Eu com o mecânico/operador de guincho João Chainho e o recuperador salvador Simão Costa fomos de imediato preparar o helicóptero para a missão enquanto o comandante João Lima se inteirava do maior número possível de pormenores para efetuarmos a missão. Regressei à sala mas as informações que tínhamos eram muito poucas, apenas já sabíamos de que se tratava do comboio do Tua mas não tínhamos coordenadas do local, a meteorologia estava péssima inclusive no aeroporto do Porto, o nosso alternante, estava quase em mínimos para operação e tínhamos pedidos insistentes para aceitarmos a missão porque segundo quem estava no local eramos a única solução.


O comandante João Lima olhou para mim e disse "Temos de ir Joãozinho senão eles morrem mas vamos perguntar ao resto da maralha" e assim fizemos. Como de costume ninguém hesitou na resposta e foi um "sim" em coro. De súbito fomos para o HOTEL1 apenas dizendo ao operador para nos informar pelo caminho via rádio ou telemóvel de todas as informações possíveis.

Enquanto me amarrava à cadeira tudo me vinha à cabeça inclusive a possibilidade de não voltar. A chuva, algum nevoeiro faziam-me navegar num mar de incertezas só ultrapassado pelos níveis de adrenalina a subir vertiginosamente. Arrancamos o primeiro motor tudo normal mas já com os vidros embaciados e com a visibilidade a reduzir. Arrancamos o segundo motor e tudo normal. Começamos todos os procedimentos para descolagem e após o check final avisei dia rádio "Santa Comba HOTEL1 a descolar até logo". Este "até logo" fazia-me suar a falso porque estava com um estranho pressentimento de que desta vez tudo ia ser muito complicado.

Começamos a subir e em altitude estava melhor mas o problema é que o sitio onde tínhamos de descer é dos piores sítios por causa do elevado número de antenas e torres com linhas de eletricidade. Era normal em rota brincarmos uns com os outros e o ambiente ter tanto de profissional como de descontração mas naquela noite ninguém falava porque estávamos todos a conversar com os nossos medos.

Com o aproximar do possível local os nossos receios começaram a se transformar em realidade, havia chuva mas também já algum nevoeiro no Rio Douro. Sobrevoamos o rio Tua a uma altitude de segurança e subimos o rio até Mirandela mas não conseguimos ver nada e descer para o escuro era puro suicídio. O telefone entretanto começou a tocar. Era o operador de rádio de Santa Comba a dizer que havia um elemento do INEM junto a uma das vitimas que necessitava de ser resgatada urgentemente de helicóptero só que nós já tínhamos feito o rio até Mirandela e nada. Entretanto acabamos por ficar sem rede móvel e comunicações via rádio e continuava a chover e a visibilidade reduzida mas nunca baixamos para altitudes onde pudéssemos encontrar obstáculos porque até sabíamos que no Tua existia um cabo de contrabando que atravessava o rio. Entretanto a autonomia do helicóptero começava a desaparecer rapidamente e aqui começa o improviso. 

O João Lima manda o operador de guincho preparar o recuperador porque o vamos descer no guincho na estação do comboio em Mirandela para obtermos mais informações. Perante a estupefação das pessoas que estavam na estação o Chainho fez descer o Simão e este quando chegou ao solo foi falar com várias pessoas e de seguida foi recuperado para dentro do helicóptero mas as noticias infelizmente para nós não eram nada boas. As pessoas nem sabiam que tinha havido um acidente, ou seja, gastamos mais tempo e combustível e continuávamos sem informações, tínhamos voltado à estaca zero. Com todas as opções a se gostarem e com nova pressão via telemóvel a partir de Santa Comba Dão de que tínhamos de encontrar o local pois o resgate já era de dois feridos mas em terra e não no rio.

De repente o João Lima decide que só havia uma solução embora arriscada que era descer durante a noite a encosta que existe junto à estação até ao rio e ir a voar junto à água a descer o Tua até ao rio Douro. De imediato o operador de guincho e recuperador abriram as portas traseiras para melhor poderem ver os obstáculos e começamos a descida mas já o nosso estado de espirito, discernimento razoabilidade e bom senso estava afetado ou seja já reagíamos aos acontecimentos e deixamos de voar à frente do helicóptero como nos dizemos. Até o João Lima gritou comigo porque parei de lhe dar a distância livre aos obstáculos do meu lado mas finalmente conseguimos ficar em estacionário e livre de obstáculos junto à água. Iniciamos então um voo lento a descer o rio tendo sempre atenção ao tal cabo de contrabando que ao fim de pouco tempo acabamos por o avistar e passamos por debaixo dele. Mais uns quilómetros de rio e por fim surge na margem uma luz muito fraca tipo lanterna a fazer sinais.

Finalmente tinham sido descobertos. Apontei a luz do Nightsun para a encosta e era uma imagem dantesca. Toda a encosta tinha desmoronado arrastando a linha lama e a própria carruagem para o rio. 

Aproximamos o helicóptero e rapidamente iniciamos a operação de resgate com guincho à primeira vítima. Esta fase foi rápida mas agora tínhamos um problema que era, onde vamos colocar a vítima. Como por milagre ouvimos pelo rádio as comunicações entre a aproximação do aeroporto do Porto e do helicóptero do INEM. Tinha sido pedido ao helicóptero do INEM para aterrar junto à estação dos comboios do Tua mas o piloto recusou por excesso de obstáculos e má visibilidade sendo então sugerido um campo de futebol. Percebemos imediatamente que era onde iriamos colocar a nossa vítima. Após a aterragem e largarmos a vitima voltamos a descolar para o local do acidente agora já com luz que os bombeiros levaram ao longo da linha até ao local. Recuperamos a segunda vítima e voltamos ao campo.

Após sermos informados de que já não havia mais vítimas na encosta nós também informamos que íamos abandonar o teatro de operações por autonomia do helicóptero para reabastecimento em Vila Real.

Após aterragem em Vila Real e quando nos preparávamos para reabastecer detectamos que a bomba de combustível estava desferrada impossibilitando o abastecimento. 

Após alguns contactos acabou por serem os bombeiros de Lamego que foram ao CMA de Armamar buscar uns tambores de combustível e os levaram a Vila Real. Após o reabastecimento lá prosseguimos de volta ao Tua mas agora já nada podíamos fazer, o nevoeiro já tinha tomado toda a área. Acabamos por voar para Aguiar da Beira para o caso de entretanto haver condições de operação. O voo até Aguiar da Beira foi quase um comprimido de relaxamento. A adrenalina a descer com o cansaço de muitas horas em stress máximo estava a dar sinais de vida. Aterramos em Aguiar e fomos para o quartel dos bombeiros onde uns sofás da sala de bombeiro pareciam uma cama de rei. Dormimos não sei quanto tempo mas acordamos já com o nascer do Sol e com o telemóvel do João Lima a ordenar o regresso à base de Santa Comba Dão.

O voo de regresso à base foi feito de sentimentos contraditórios, missão cumprida mas também muita incerteza em relação ao desfecho final da missão porque afinal o que tinha terminado foi e somente apenas o primeiro de vários dias com muitas outras situações que se iriam prolongar por mais sete dias".

(CONTINUA)

19 comentários:

  1. Uma homenagem merecidíssima a todos os heróis anónimos... que muitas vezes, só se tornam menos desconhecidos, quando morrem, infelizmente!...
    Grata por nos mostrares as condições, de grande perigo, com que estes profissionais se defrontam, em muitos dos seus dias... e que por vezes, nem todos os demais, terão noção... e depois, para além das dificuldades no terreno, e de falta de visibilidade... há os fios... não sinalizados... com as consequências... que se sabem...
    Grata, por esta impressionante partilha, Rui!
    Beijinhos! Bom fim de semana!
    Ana

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  2. Relato muito pormenorizado, na 1ª pessoa, e que me deixou com o coração extremamente apertado.

    O meu blogue faz hoje 5 anos. Qdo lhe for possível, gostaria que passasse por lá, mas sem pressas, pois aquilo que nos acaba de contar é bem mais importante.

    Beijinho e força!

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  3. As fotografias demonstram bem, infelizmente, o que foi este este triste acontecimento.

    Obrigada!

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  4. Lembro-me perfeitamente desta terrível notícia. E mais algumas! :(
    Obrigada pelo texto!
    -
    Não peco por gostar de ti...
    -
    "Novidades".
    -
    Beijos. Boa noite!

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  5. Merece la pena ser recordado, para hacer ver la gran entrega de estas personas que se dedicaron a socorrer a las víctimas. ellos hicieron una gran labor .

    Besos

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  6. Hoje já não é cedo.
    Por isso, deixo a leitura para o fim de semana.

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  7. Immagini straordinarie in memoria di un evento fortemente doloroso.
    Un caro saluto,silvia

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  8. Uma reportagem trágica, e bem documentada , com excelentes fotos.

    Beijos Rui

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  9. Meu Deus!!
    Tenho a maior admiração por esses heróis que arriscam suas vidas para salvar outras!
    Aqui, quando passa o Corpo de Bombeiros defronte os prédios para saldarem o Ano Novo, todos correm aos terraços para abanar e cumprimentar nossos heróis! Coisa que ninguém faz a nenhum político...Mas esses estão em primeiro lugar da lista dos mais respeitados pela população.
    Linda matéria, Rui, parabéns!

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  10. Meu Deus... que emocionante e os olhares estão lindos!!! Bj

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  11. Fico triste com este tipo de noticias.
    Existem pessoas com tão nobre coração que nem uma homenagem lhes fazem após a sua partida.
    Um bem haja a quem salva vidas todos os dias.
    Com tristeza no coração.
    Megy Maia

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  12. Tenho grande admiração por estas pessoas que arriscam suas vidas para salvar a vida de outrem
    Um relato sofrido e doloroso emoldurado por imagens que me passa a sensação de agonia dos heróis na busca do salvamento
    Uma homenagem linda deste protagonista que viveu o estresse dessa missão
    Beijinhos poéticos

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  13. Os grandes heróis da vida, ficam muitas vezes no esquecimento. Que bom que existam relatos que nos dão a conhecer a coragem do grande homem que foi João Lima.
    Abraço e bom domingo

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  14. Gostei muito desta tua excelente reportagem,
    com fotos da melhor qualidade. Parabéns!

    Uma ótima semana, amigo Rui
    Um abraço

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  15. ·.
    Impresionante. Los hechos relatados poner en valor a los servicios de salvamento y rescate. Enhorabuena Rui.
    Seguiré atento a la segunda parte.
    Por cierto, en Setiembre pasado estuve por esa zona. En Mirandela, por ejemplo.
    Un abrazo Rui

    LaMiradaAusente · & · CristalRasgado

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  16. Passando a deixar um beijinho e votos de uma excelente semana...
    Ana

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